Escrito por: CUT Paraná
Ato será realizado nesta quarta-feira (9), às 8h, na Assembleia Legislativa do Paraná
A Frente Feminista de Curitiba e Região Metropolitana promove nesta quarta-feira (9), às 8h, um ato de resistência contra a criminalização do aborto. A atividade acontecerá no momento em que uma Audiência Pública debaterá o Projeto de Lei 303/17 que pretende instituir o “Dia Estadual Contra o Aborto”. A proposta é do deputado Cobra Repórter (PSD-PR).
“Enquanto criminalizam o aborto milhares de mulheres morrem por ano em busca de uma solução legal. Este tipo de ação não contribuí com o debate, muito pelo contrário, amplia o problema e o número de mortes de mulheres que não para de crescer”, avalia a secretária da mulher da CUT Paraná, Anacelie Azevedo.
De acordo com ela, este tipo de ação, além de criminalizar o aborto e contribuir para a morte de milhares de mulheres por ano, vai contra todos os estudos e debates desenvolvidos ao longo dos anos, inclusive nas Conferências de Polícias para as Mulheres. “Este tema também foi debatido em outros encontros públicos, como as conferências de saúde em todas as esferas de governo”, completa.
Serviço: Resistência contra a criminalização do aborto.
Data: Quarta-feira, 9 de maio de 2018.
Horário: 8h
Local: Plenarinho da Assembleia Legislativa do Paraná, Praça Nossa Senhora de Salete, s/n, Centro Cívico. Curitiba-PR.
Confira a nota dos movimentos feministas:
NOTA DA FRENTE FEMINISTA DO PARANÁ SOBRE O PL 303 DO DEPUTADO COBRA REPÓTER
A VIDA E A SAÚDE DAS MULHERES IMPORTAM
Estamos presentes nessa Audiência Pública, na Assembleia Legislativa do Paraná, para debater o Projeto de Lei 303/17, de autoria do deputado estadual Cobra Repórter, que propõe a criação do “ dia conscientização da população contra o aborto” no calendário oficial do estado.
Apresentamos nesta nota nossas consideraçõessobre o aborto e outras questões fundamentais em relação à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres para subsidiar parlamentares, demais autoridades e público em geral.
Breve histórico
Desde os anos 80, as mulheres organizadas tem participado ativamente nos movimentos de saúde para que se efetivem as propostas previstas no antigo PAISM- Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher de 1983, que após atualização passou em 2004 passou a ser uma política de estado com a denominaçãoPNAISM- Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Além de contemplar ações de prevenção, promoção, assistência e reabilitação, visa a atenção a mulher na sua integralidade, nas várias faixas de idade, e também em suas condições de vida e de trabalho. Suas diretrizes foram referendadas no relatório da 1ª Conferência Nacional de Saúde da Mulher de 1986 e contribuíram para a criação do Sistema Único de Saúde –SUS- em 1988.
Mais recentemente, em agosto de 2017, realizou-se a 2ª Conferência Nacional de Saúde das Mulheres com a presença de 1.200 mulheres delegadas, mais de cem propostas foram esmiuçadas nos grupos, com reivindicações para que se garanta acesso a saúde das mulheres dentre elas o acesso a todos os métodos contraceptivos e a educação sexual nas escolas, além de serviços de apoio e medicação para portadoras de HIV-aids, o combate ao racismo institucional e ao preconceito contra a população LGBTII, assegurando-se melhor formação aos profissionais de saúde , dentre outras. Levada à votação em plenária, a proposta de descriminalização obteve maioria de votos.
Portanto as entidades que assinam esta Nota afirmam que é preciso muito mais informação e debates qualificados sobre o tema, para que a sociedade brasileira possa se posicionar de forma mais serena a esse respeito. À luz desse histórico de contribuições e conquistas sobre a Saúde das Mulheres é que reivindicamos nosso direito à palavra nessa Audiência e deixamos aqui, por escrito, nossos argumentos e posicionamento.
Considerações:
1-A prática do aborto é uma realidade social, uma vez que é frequente e generalizada no Brasil, com mais de 500 mil casos a cada ano; quase sempre realizados através de uso de medicamento, e com metade dos casos sendo finalizados em hospitais. Inclui mulheres de todas as religiões, níveis de renda e de escolaridade, casadas ou não. Tem índice mais elevado entre as não brancas, mais pobres e com menor escolaridade 1,2,3.
2- Por outro lado, o Ministério da Saúde registra quase 200 mil internações anuais pelo SUS, por complicações pós-abortoA estimativa de gastos pelo SUS com procedimentos emergenciais para o atendimento de mulheres devido a um aborto inseguro chegaram a142 milhões de reais,20133,4.
3-A Organização Mundial da Saúde afirma que as complicações decorrentes do aborto ilegal são responsáveis por uma em cada 8 mortes de mulheres grávidas no mundo e que a morte materna é maior nos países que criminalizam o aborto1.
4-No Paraná o aborto representou 4% das mortes maternas entre 2010 e 2017, sendo responsável por 22 óbitos, representando a quinta causa evitável de mortalidade materna. Verificou-se ainda que 204 dos 399 municípios no estado apresentavam taxas de gravidez na adolescência superiores a 20% em 2015, denotando falhas no acesso a formas seguras e adequadas de contracepção 5,6.
5- A ilegalidade do aborto expõe muitas mulheres a processos judiciais, que geram gastos econômicos e desgaste emocional a mulheres e suas famílias. Levantamento junto aos Tribunais de Justiça de 20 estados mostra que, em cada dia do ano de 2017, uma mulher foi processada por aborto auto-provocado; a maioria foi denunciada por profissionais de saúde, aviltando seus códigos de ética e a Norma Técnica do MS que orienta o atendimento digno a todas as mulheres em situação de abortamento7.
6- Cerca de 55 países já descriminalizaram o aborto e vários estudos confirmam que a legalização não aumenta os casos de aborto, mas sim ocorre a diminuição das mortes maternas. Relatos recentes dos dez anos de legalização do aborto em Portugal e dos 5 anos da mesma situação no Uruguai precisam ser conhecidos e debatidos 8,9,10.
7- Pesquisa do Instituto Ideia Big Data, divulgada no Jornal Valor Econômico, aponta que cerca de 60% dos brasileiros concordam que “mulheres que fazem aborto não deveriam ser punidas criminalmente”, contra 31% que discordam. Outra pesquisa de opinião realizada em 2017 pela entidade Católicas pelo Direito de Decidir-CDD, junto com o IBOPE, apontou que 64% da população brasileira – incluindo católicos e evangélicos – entende que a mulher que realizou procedimento para interrupção da gravidez não deve ser presa e que cabe à mulher decidir sobre a questão11,12. Esse resultados demonstram que a maioria da população é contra a imposição da penalização de aborto, estando a “voz do povo” em consonância com todos os documentos internacionais que estabelecem a garantia dos direitos sexuais e reprodutivos como direitos humanos.
O QUE ENTENDEMOS E DEFENDEMOS
O PL 303 revela uma posição dogmática ao propor uma data no calendário oficial para pregarCONTRA o direito ao aborto. A Frente Feminista do Paraná rejeita esse projeto que desconsidera a complexidade do tema e sua repercussão na saúde e na dignidade das mulheres.
Entendemos que o estado do Paraná não pode acatar essa proposta em sua programação sem ferir o princípio do Estado laico, inscrito em nossa Constituição Federal de 1988.
Defendemos que o direito à interrupção voluntária da gravidez- IVG- é parte dos Direitos Sexuais e Reprodutivos e dos Direitos Humanos, representa a defesa da vida e dignidade das mulheres e é instrumento importante para combater a violência institucional contra as mulheres que chegam aos serviços em situação de abortamento. Portanto, é fundamentalmente uma questão de Justiça Reprodutiva e Justiça Social 13!
ASSINAM FRENTE FEMINISTA DO PARANÁ : RFS- Rede Feminista de Saúde, Direitos sexuais e Reprodutivos-PR APP/Sindicato, Associação dos Professores do Paraná,CFESS- Conselho Federal de Serviço Social e Câmara Técnica de Ética e Direitos Humanos do CRESS/PR, Marcha Mundial de Mulheres /PR, Núcleo de Estudos de Gênero da UFPR, Rede Mulheres Negras- PR, UBM- União Brasileira de Mulheres- PR, Marlene Tamanini / Núcleo de Estudos de Gênero e da Escola de Política e História do Feminismo da UFPR, Coletivo da Vereadora Professora Josete)
Referências:
1.OMS. Abortamento seguro: orientação técnica e de políticas para sistemas de saúde. 2ª ed., OMS: 2013.
2.MADEIRO, Alberto Pereira; DINIZ, Debora. Serviços de aborto legal no Brasil – um estudo nacional. Ciência & Saúde Coletiva, v. 21, n. 2, p. 563-572, 2016
3.DINIZ, Débora; MEDEIROS, Marcelo e MADEIRO, Alberto. Pesquisa Nacional de Aborto 2016. Ciência e Saúde Coletiva: 22(2):653-660; 2017.
4.O GLOBO. Tabu nas campanhas eleitorais, aborto é feito por 850 mil mulheres a cada ano
Disponível em: <https://oglobo.globo.com/brasil/tabu-nas-campanhas-eleitorais-aborto-feito-por-850-mil-mulheres-cada-ano-13981968#ixzz4yKXw0N1n>
5. CEPMM- Comitê Estadual de Prevenção da Mortalidade Materna,
6. Datasus/Ministério da Saúde
7.Portal Catarinas- 3/5/2018
8. Segundo The Word’sAbortion Law (2014), cerca de 55 países não impõem restrições para a prática da IVG, entre eles: Alemanha, Bélgica, Espanha, Estados Unidos, Grécia, Itália, Portugal, Uruguai. Disponível em:
9. OBERVATÓRIO NACIONAL EM GÉNERO Y SALUD SACUAL Y REPRODUCTIVA/MUHER Y SALUD. Servicios legales de aborto em Uruguay. – Logro y desafíos de su funcionamiento. Montevideo, 2017. Disponível em: <https://issuu.com/mujerysaludenuruguay/docs/folleto_20obs_10-19_web>.
10.EXPRESSO. Há menos abortos, menos reincidência e nenhuma mortalidade materna: 10 anos de IVG. Disponível em: <http://expresso.sapo.pt/multimedia/259/2017-07-17-Ha-menos-abortos-menos-reincidencia-e-nenhuma-mortalidade-materna-10-anos-de-IVG>
11.FLORES, Paulo. Qual o nível de conservadorismo do brasileiro. NEXO JORNAL, 2017. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/11/25/Qual-o-n%C3%ADvel-de-conservadorismo-do-brasileiro.
12.Percepções sobre o aborto e educação sexual. Pesquisa de opinião publica. Ibope e Católicas pelo Direito de Decidir. http://catolicas.org.br/wp-content/uploads/2017/10/Pesquisa-de-Opini%C3%A3o-P%C3%BAblica-2017-CDD-e-IBOPE-Percep%C3%A7%C3%B5es-sobre-aborto-e-educa%C3%A7%C3%A3o-sexual_3-MB.pdf
13. REDE FEMINISTA DE SAÚDE. Posições Políticas – gestão 2011-2015. Manifesto contra a criminalização das mulheres que praticam o aborto. Disponível em: <http://redesaude.org.br/comunica/wp-content/uploads/2015/05/encarte_rede_visual.pdf