Escrito por: Gibran Mendes, da CUT-PR

PR: Ratinho Júnior ameaça sistema público com proposta de privatização de escolas

E o que mães, pais e alunos têm com isso? Entre outros efeitos negativos da medida, as vagas serão por sorteio, terá cobrança de matrícula e ampliação de fraudes

Agência Estadual de Notícias
O governador do Paraná, Ratinho Júnior

O governo do Paraná, comandado por Ratinho Junior (PSD), pretende privatizar 27 escolas públicas ao custo de R$ 200 milhões no primeiro ano. É isso mesmo que você entendeu: o governo vai pagar para empresários gerirem as escolas com os recursos arrecadados, entre outras coisas, pelos impostos pagos pelos cidadãos e cidadãs paranaenses.

De acordo com a proposta, os valores seriam destinados a grupos empresariais que fariam a gestão das unidades de ensino que atendem atualmente quase 22 mil estudantes.

Se ainda tem pais, mães ou alunos se perguntando o que é que têm a ver com isso, os dirigentes sindicais da área da educação respondem de forma direta, clara e objetiva.

Este é o primeiro passo para colocar a educação pública em estado de extinção, avalia a direção do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP-Sindicato).

É uma ameaça ao sistema público da educação e pode se espalhar por todo o Brasil, alerta a direção da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).

Sobre a proposta

O edital de privatização de 27 escolas do Paraná foi lançado em meio ao 2º turno da eleição, período que o governo do Estado avaliou como propício para desviar o foco da medida e “passar a boiada” na educação pública, como entendem bem do assunto os bolsonaristas, como Ratinho Júnior.

Como já vimos, trata-se de um projeto de grande impacto que está sendo tocado às pressas, no final da gestão, para que até o final de novembro o processo seja concluído, afirma o presidente da CUT Paraná, Marcio Kieller. É mais um atropelo de Ratinho Júnior, diz o dirigente.

“Ao longo destes quatro anos o governador notabilizou-se pela falta de diálogo com a classe trabalhadora e seus representantes. Agora, sem diálogo algum com a sociedade, quer privatizar o ensino público”, criticou Kieller.

“Os recentes casos de privatização e terceirização no serviço público já mostram o que podemos esperar caso esse projeto seja aprovado”, destacou o presidente da CUT-PR.

“Vamos resistir e lutar para que este projeto, que é inconstitucional, seja barrado porque, como sempre, os prejudicados serão os trabalhadores e as trabalhadoras”, completou.

A análise de Kieller é reforçada pela ausência de representantes do Governo do Estado em uma audiência pública realizada na última segunda-feira (7) na Assembleia Legislativa do Paraná. Do outro lado, a APP-Sindicato, estudantes, direções escolares, pesquisadores e parlamentares participaram e destacaram o tamanho do problema que se avizinha, de forma unânime.

“Escondem porque sabem que está errado. O Estado está vendendo o que não é dele. Escola pública não é do governador e muito menos do secretário. É do povo, dos filhos, filhas, dos trabalhadores e trabalhadoras e da comunidade que constrói diariamente a educação”, afirmou a presidenta da APP-Sindicato, Walkiria Mazeto.

O presidente da CNTE, Heleno Araújo, corrobora as críticas de Kieller e de Walkiria e alerta para a ampliação de fraudes a partir da imposição deste modelo. Segundo ele, as fraudes ocorrem em um maior número, tanto do ponto de vista pedagógico quanto financeiro, abrindo espaço ainda maior para a corrupção.

“Outros países que implantaram essa medida tiveram aumento de fraudes. Tanto financeiras, aumentando a corrupção, como também pedagógicas. Essa contratação vincula o dinheiro público para essas empresas privadas vinculadas com metas. Então para alcançar essas metas vem as fraudes pedagógicas, onde as crianças não aprendem, não avançam nos seus conhecimentos”, exemplificou.

Ainda de acordo com ele há o agravante de imposições pedagógicas. “É um fato muito complicado para a população e para nós, principalmente neste contexto ideológico, quando querem nos amordaçar. Isso é muito perigoso”, completou.

Sorteio e sigilo

A presidenta da APP-Sindicato, Walkiria Mazeto, também enfatizou que a luta pela escola pública é de todos e todas e não deve ficar restrita a determinados setores, com impactos na educação dos filhos, mas também, na própria logística dos responsáveis.

“Aquele pai e aquela mãe que hoje tem seu filho em uma escola municipal e está vislumbrando uma vaga em uma unidade perto de sua casa não tem mais essa vaga garantida. O edital diz que as novas matrículas serão por sorteio. A empresa vai escolher qual estudante ela quer que estude lá. Não é mais que mora perto, não. Ela vai sortear”, condenou.

“Por isso estamos aqui, sim, denunciando esse edital na Assembleia Legislativa, por onde ele não passou, porque ele não passou em lugar nenhum e toda a documentação dele está em sigilo. Já pedimos acesso ao parecer jurídico e foi negado. O protocolo inteiro está em sigilo. Também pedimos e foi negado. Não aprovaram o pedido de informações solicitados pelos deputados estaduais. Mas por que esconder tanto? Se está à venda uma coisa que é pública por que as informações não estão disponíveis?”, questionou a professora. Outra possibilidade, como já acontece com as escolas cívico-militares de Ratinho Júnior, é a cobrança de matrícula para os estudantes destas unidades escolares.

Negócio da China

Estudo realizado pela APP-Sindicato mostra que a previsão de R$ 800 de custo, por aluno, estabelecida pelo Governo do Estado levará ao bolso dos empresários ao menos R$ 200 de lucro. O resultado seria R$ 200 milhões a menos para serem investidos na educação desviados para a iniciativa privada.

Esse cálculo é para apenas um ano e envolve somente as 27 escolas que estão presentes no edital. Em um caso hipotético da privatização ser ampliada para toda a rede o rombo seria de R$ 10 bilhões anuais. O custo de R$ 800 por aluno, ainda por cima, está muito próximo do valor médio de mensalidades e escolas particulares em Curitiba, que é de R$ 867,11.

“A privatização sempre promete um menor custo com mais qualidade. Em todas as experiências que nós vivemos, o contrário foi entregue: maior custo e piora dos serviços prestados”, alerta o economista responsável pelo estudo, Cid Cordeiro.

Situação semelhante pode ser observada com a terceirização de funcionários e escolas. O custo passou de R$ 320 milhões com contratos PSS para R$ 536 milhões. O mesmo estudo também mostrou que um balanço a partir de informações de 26 estados coloca o Paraná na 23ª posição no crescimento do investimento em educação pública entre 2019 e 2021.

Repercussão

O edital está gerando uma série de repercussões negativas no ambiente educacional. “O edital lançado oficialmente pelo Paraná Educação, é inconstitucional, incorre em diversos equívocos para a gestão da educação pública pois fere de maneira direta o princípio da gestão democrática da escola pública, princípio de organização do sistema educacional brasileiro, conforme dispõe o inciso VI do art. 206 da Constituição Federal”, diz trecho do texto.

“O departamento de educação da Universidade Estadual de Londrina (UEL) também divulgou uma nota de repúdio. "(O edital) desresponsabiliza o Estado da sua função social no atendimento e na gestão da demanda de escolarização de crianças, jovens, adultos e idosos, destitui os fins públicos da educação básica, dissemina a gestão gerencialista e meritocrática da educação pública, elimina os fins públicos da educação e a autonomia político-pedagógica da escola, descumpre com o princípio legal da gestão democrática, fecha escolas noturnas e de Educação de Jovens e Adultos e não coaduna com a perspectiva de educação pública de qualidade para todos, sob a responsabilidade do Estado”, diz a nota.

O deputado estadual Professor Lemos (PT), resumiu a situação. “Na prática é a entrega de equipamentos públicos da área da educação para a iniciativa privada”, apontou.

O também deputado estadual Tadeu Veneri (PT), eleito deputado federal, apontou para os problemas da terceirização. “Nos chama a atenção que todos os funcionários serão contratados pela empresa, os que não são, obviamente, concursados, como diretores, pedagogos e professores. Porque, salvo engano, Agentes I e II já foram todos terceirizados por aquelas 13 empresas contratadas, que fizemos a denúncia ao Ministério Público do Trabalho, que oito delas foram posteriormente habilitadas. Acredito que em cinco anos teremos talvez 20% do que temos hoje nas escolas, reduziria o impacto na folha em um percentual muito alto, o que beneficia exatamente os grupos que detém um poder muito grande no estado e que privatizam o estado por dentro”, alertou.