Escrito por: Davi Macedo / SindiPetro PR/SC
Unidade em São Mateus do Sul está sob ameaça de privatização ou até mesmo de fechamento
Neste 1º de junho, a Superintendência de Industrialização do Xisto (SIX/Petrobrás) completa 67 anos. Está sediada em São Mateus do Sul, região sudeste do Paraná, sobre a segunda maior reserva mundial de xisto, a Formação Irati, que abrange os estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e Goiás.
A unidade minera e processa essa rocha sedimentar com conteúdo de matéria orgânica, também chamada de folhelho pirobetuminoso, para gerar óleo e gás. A Petrobrás iniciou a exploração do xisto em 1954, em Tremembé-SP. Em 1959, decidiu pela construção de uma usina no município paranaense e posteriormente toda a administração do projeto SIX também veio para cá.
O início da operação da primeira unidade de produção ocorreu em 1972. Após muitos anos de esforço da categoria petroleira e investimentos em pesquisa por parte da Petrobrás, em 1991 o módulo industrial entrou em operação, consolidando, assim, a tecnologia de extração e processamento do xisto, denominada Petrosix®.
A capacidade instalada da SIX é de 5.880 toneladas/dia. Os principais produtos gerados são óleo combustível, nafta, gás combustível, gás liquefeito, enxofre e outros subprodutos utilizados nas indústrias de asfalto, cimenteira, agrícola e de cerâmica.
A unidade ainda funciona como um centro avançado de pesquisa na área de refino e desenvolve vários projetos em conjunto com o Centro de Pesquisa da Petrobrás (Cenpes) e algumas universidades. O parque tecnológico da SIX é o maior da América Latina e um dos maiores do mundo em plantas-piloto, composto por 15 unidades criadas para atender as necessidades dos variados processos de refino.
Além de toda pesquisa e tecnologia, a SIX é vital para São Mateus do Sul e região, pois é a maior contribuinte do município, respondendo por cerca de 45% da arrecadação de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e aproximadamente 45% do Imposto Sobre Serviços (ISS). Gera mil empregos diretos, entre trabalhadores próprios e terceirizados, e outros dois mil indiretos. Seu lucro anual aproximado é de R$ 200 milhões.
A Usina ainda contribui com o município e estado a partir do pagamento de royalties sobre a produção de óleo e gás de xisto. É justamente aí que se esconde um problema que coloca o futuro da SIX em xeque. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) multou a Petrobrás pelo não pagamento de royalties entre os anos de 2002 e 2012. A estatal paga alíquota de 5%, mas a Lei do Petróleo prevê 10% de royalties. A argumentação da empresa é de que não se trata do mesmo produto, tampouco do mesmo processo. A operação na SIX, segundo a Petrobrás, é de óleo e gás de xisto que são extraídos a partir do aquecimento da rocha, método único no mundo e patenteado pela companhia. O montante da multa e da diferença nos royalties estariam em cerca de R$ 1 bilhão.
A direção da Petrobrás ameaçou fechar a unidade, assim como fez com a Fafen-PR, acaso a prefeitura de São Mateus do Sul e o governo do Paraná não aceitem renegociar a dívida de royalties sobre a exploração de xisto. A gestão da estatal enxerga no passivo um fator que atrapalha seus planos de privatizar a Usina do Xisto.
Infelizmente, a SIX chega ao seu 67º aniversário com muito mais dúvidas do que certezas sobre o seu futuro.
Alimentada de Crises
Paulo “Reissinho” de Paula é petroleiro aposentado, ex-diretor sindical e foi membro da primeira equipe de operadores da SIX. Saiu de Apuracana, no norte do Paraná, após passar no concurso da Petrobrás. Ingressou na empresa em 1971, lotado na Usina do Xisto, e só saiu por motivo de aposentadoria, em dezembro de 1993.
Hoje está com 72 anos e mantém o perfil de “petroleiro raiz”. Tem orgulho da Petrobrás e da SIX que ajudou a construir e defende a soberania nacional com unhas e dentes. Lembra com satisfação da transformação tecnológica pela qual a unidade passou. “A Usina representa o motor de desenvolvimento da região. Mais do que isso, também é a concretização do projeto de desenvolvimento chamado PetroSIX, que revolucionou a exploração do xisto. Antes disso, a produção era nos moldes do ‘Perna de Pau(*)’”, afirma.
Engana-se quem acha que essa transformação foi tarefa fácil. Reissinho conta que o projeto SIX teve muitas imperfeições e precisou de grandes adaptações. “Tudo solucionado dentro da própria unidade, a partir da engenharia e dos palpites dos operadores”, recorda.
Quando questionado sobre os planos de privatizar a SIX, o antigo operador logo disparou: “Privatização? Na minha opinião nem deveria se falar nisso. A unidade evoluiu demais ao longo dos anos. Por que quando tudo era mais difícil ela deveria ser da Petrobrás e agora com toda essa capacidade de produção e tecnologia querem vender? A privatização vai matar a ideia de um projeto de desenvolvimento de exploração do xisto. A SIX tem sabor de soberania e gosto de desenvolvimento. Os privatistas querem matar tudo isso”.
Ainda sobre o cenário nebuloso que ronda a SIX, Reissinho lembra que a unidade “sempre se alimentou de crises”. “Lá no início da década de 90 fizeram um fuzuê e disseram que iriam hibernar o módulo industrial UPI (unidade de Processamento do Irati) antes mesmo de ser concluído e colocado em operação. Um dos que tiveram essa ideia era o tal ministro João Santana, de Minas e Energia. Esse caboclo teve uma recepção de enfrentamento quando veio visitar o módulo ainda em construção. Estendemos uma faixa bem grande que trazia a frase ‘Ministro João Santana, sua missão é cuidar do patrimônio público e não entrega-lo’. A Usina nem havia sido terminada e a ideia de privatizar já existia naquela época”.
*Perna de Pau
Ascom / SindiPetro PR/SC
Roberto Angewitz (São Bento do Sul, 29/10/1878 – Curitiba, 22/10/1947), também conhecido por “Perna-de-pau”, foi um pioneiro na exploração do xisto betuminoso em São Mateus do Sul. Filho de Maximiliano Angewitz, ou Andziewicz, e Nathalia Cyms, imigrantes alemães que vieram para São Bento do Sul. Aos oito anos, foi mordido na perna direita por uma cobra, o que lhe custou a amputação do membro e a sua substituição por uma de madeira – o que lhe rendeu o apelido. Por volta do começo do século XX, se mudou para Curitiba, onde foi motorista de táxi e também abriu uma fundição de bronze e ferro. A 1ª Guerra Mundial fez com que seu negócio ruísse. Depois, montaria uma oficina de reparações. Em 1932, quando as restrições cambiais tornaram muito difícil a importação de gasolina, realizou em São Mateus do Sul experiência de destilação do xisto. Aos poucos, obteve os primeiros resultados satisfatórios, conseguindo produzir gasolina e outros produtos. Passou então a se dedicar exclusivamente à atividade pioneira, criando inclusive a primeira usina para exploração e destilação do xisto. Foi por algum tempo um dos raros homens que podia dispor de gasolina no Brasil e que sabia como obtê-la. O pioneirismo, no entanto, fez com que não tomasse alguns cuidados e, consequentemente, fosse lentamente envenenado pelos gases com que lidava. Com o surgimento da campanha nacional do “O Petróleo é Nosso”, não houve como defender-se dos interesses do governo, que adquiriu a sua inovadora usina e lhe deu em troca apenas 200 contos.
Em 1935, o “Perna de Pau” chegou a produzir mais de 300 litros de óleo por dia na sua pequena usina. Em frente à SIX existe uma estátua do memorável “Perna de Pau” (foto).