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Artigo

Luiz Carlos Paixão da Rocha

Publicado: 21 Agosto, 2009 - 00h00

Por mais que queiram negar, o racismo um fenmeno presente e estrutural da sociedade brasileira. Ele se reproduz nas mais diferentes esferas e formas. constantemente criado e recriado. A construo de um pas democrtico e justo passa necessariamente pelo combate a todas as formas de discriminao, entre elas, a discriminao tnico-racial.

Assisti estarrecido no dia 20 de agosto mais uma reportagem na televiso sobre um caso de discriminao racial. Desta vez no Supermercado Carrefour, em Osasco, na grande So Paulo.

O trabalhador e cidado negro Janurio Santana, segurana e tcnico em eletrnica agredido de forma covarde por um grupo de seguranas do referido supermercado. O motivo alegado de que ele foi confundido com ladres e considerado suspeito de roubar o seu prprio carro, uma EcoSporte.

O fato ocorreu em 07 de agosto, enquanto Santana aguardava - no carro e com a filha de dois anos - a famlia fazer compras. Aps o alarme de uma moto disparar no estacionamento do supermercado, desceu do carro e logo foi abordado por seguranas. Um destes apontou uma arma. Santana foi levado a uma sala e foi covardemente agredido por cinco seguranas.

O trabalhador negro cliente do referido supermercado afirmou que as agresses s pararam com a chegada de um policial militar, mas, mesmo assim, continuou a ser humilhado. Voc tem cara de quem tem passagem (pela polcia). No mnimo, umas trs passagens. Tua cara no nega, nego, afirmou Santana, reproduzindo o que teria dito um dos homens.

De tanto insistir, foram at o automvel onde sua famlia o esperava. Aps conferir a documentao, os policiais foram embora. "J passei outros constrangimentos com esse carro. Acho que vou vender", disse ele.

Na reportagem, aos prantos, a esposa de Santana, Maria dos Remdios se preocupa com o futuro dos filhos. Pode acontecer com eles tambm porque eles so negros. E isso me di. Acho que o negro no pode viver, no pode ter os seus bens conquistados e me deixa muito ferida.

A reportagem causa repulsa e indignao, tamanha a criminalizao pela cor. O trabalhador negro vende sua fora de trabalho em jornadas duplas a fim de garantir um pouco de qualidade de vida para a sua famlia. Qualidade que historicamente lhe foi negada. Qual o lugar do negro na sociedade brasileira? No basta ultrapassar as barreiras sociais, preciso ultrapassar as barreiras raciais. Em um pas onde o racismo opera, estas so quase intransponveis.

Corajosamente, Santana divulgou o episdio na imprensa e, nos prximos dias, ingressar com ao judicial. A polcia de So Paulo abriu inqurito para investigar o caso. Afirmou, em nota, que no compactua com nenhum tipo de discriminao e que instaurou um procedimento para averiguar o fato. Tambm em nota, o grupo Carrefour diz que repudia qualquer forma de agresso ou desrespeito. E que vai colaborar com a polcia, alm de esperar que os responsveis sejam rigorosamente punidos. Segundo o Carrefour, os seguranas so terceirizados, um deles foi afastado.

As investigaes possivelmente se perdero no tempo e no espao das teias das estruturas, quase invisveis, do racismo social brasileiro. A punio dos culpados e a indenizao, embora fundamentais, sero insuficientes para que a me possa imaginar um futuro justo para os seus filhos. Estas precisam estar acompanhadas de um amplo programa de implementao de polticas pblicas em virtude da dvida social que o pas tem com a populao negra brasileira. Polticas pblicas para rea da educao, da sade, do mercado de trabalho, da mdia, da segurana pblica, entre outras.

Para alm das notas, das punies dos culpados e de possveis indenizaes, o fato marcar profundamente a alma da famlia negra de Janurio Santana e Maria dos Remdios. Sem sombra de dvidas, amanh a imprensa brasileira esquecer desta autntica famlia brasileira. Enquanto o estado brasileiro no levar isto a srio, muitos outros casos como o de Janurio continuaro acontecendo nos hipers e micros mercados da vida, no atacado e no varejo.
Acorda Brasil!


Luiz Carlos Paixo da Rocha Mestre em Educao e professor da rede Estadual do Paran. Atualmente Secretrio Estadual de Imprensa e Divulgao da APP-Sindicato dos Trabalhadores em Educao do Paran e Integrante do Coletivo Nacional Contra a Discriminao Racial da CUT.

Assista a reportagem: http://shasca.blogspot.com/2009/08/no-carrefour-racismo-social.html