Muito mais que um teto: ocupação no Paraná mobiliza sociedade
Espaço batizado de Dom Hélder Câmara, em Paiçandu, luta pela regularização dos imóveis para uma comunidade formada na solidariedade
Publicado: 17 Fevereiro, 2025 - 11h20 | Última modificação: 17 Fevereiro, 2025 - 11h27
Escrito por: CUT-PR

Aproximadamente 1.600 reunidas em um conjunto de seis torres, com 240 apartamentos e que cuja construção foi abandonada em 2014 pela construtora. Além de um lar, o local também se transformou em um centro de cultural, cidadania e solidariedade. Estas características fizeram com que a ocupação fosse chamada de “muito mais que um teto” por todos os envolvidos. São imóveis, que fariam parte do Minha Casa, Minha Vida, acabaram sendo ocupados em janeiro de 2023 e tornaram-se a Ocupação Dom Helder Câmara em Paiçandu, cidade na região Noroeste do Paraná.
“A situação hoje é que a ocupação promoveu uma série de transformações na região. Era um espaço completamente degradado, tomado pela criminalidade, tomado pelo mato e pela sujeira. Enfim, nós reurbanizamos, nós revitalizamos o espaço, onde não havia sequer janelas”, explica o professor de Ciências Sociais da Universidade de Estadual de Maringá (UEM), Pedro Jorge, que é integrante da coordenação da ocupação. “Hoje os apartamentos têm janelas de blindex, colocamos caixas d´água que também não existiam, fizemos os telhados e a ocupação tornou-se para as pessoas que estão morando lá, com a possibilidade de uma vida mais digna, de uma vida mais segura”, completa o professor.
A defesa da ocupação passa, também, pela vizinhança. Se antes os “predinhos”, como são conhecidos na região, eram espaços de insegurança e que despertavam medo, hoje garantem sensação tranquilidade. “Há relatos que os moradores evitavam passar por ali a todo custo. Os usuários de transporte coletivo preferiam descer dois pontos antes para evitar os ‘predinhos’. Furtos tornaram-se comuns e até mesmo passar de carro era perigoso, pois miguelitos eram usados para furar pneus e obrigar os carros a pararem”, recorda o Pedro Jorge. De acordo com ele, estatísticas informais repassadas por integrantes da Polícia Civil dão conta de que a criminalidade foi reduzida em mais de 80% após a ocupação que tem regras rígidas de convivência e segurança.
“Estamos todos mobilizados com o objetivo de garantir a desapropriação das torres da Ocupação Dom Helder. É o mínimo para garantir o direito à moradia e valorização de muitas vidas e solidariedade que existe naquele espaço que irradia no entorno, com a efetiva transformação positiva que vem ocorrendo. É uma luta da CUT, é uma luta nossa e é uma luta que deveria abranger toda a sociedade”, garante a secretária-geral da CUT Paraná, Vera Nogueira, que acompanha a situação em nome da Central.
Estrutura – A ocupação conta com um corpo de psicólogos garantindo atendimento especializado para crianças e adultos que convivem, diariamente, com a insegurança de não saber onde estarão morando amanhã. O receio é de que tipo de reação uma eventual reintegração de posse possa gerar.
“A nossa demanda, qual que é hoje, é que o governo federal, o governo estadual, ou a administração municipal, se posicione para evitar que isso aconteça. Que a gente chegue a uma conclusão, que a gente chegue a uma resolução. E o caminho mais fácil é pela desapropriação. Ressaltando que as pessoas que estão lá não estão querendo receber um presente do governo federal, do governo estadual ou do município. Eles querem que tenha essa desapropriação para que se regularize essa questão da reintegração de posse e que depois seja estabelecido um preço em que elas possam pagar”, destaca o integrante da coordenação.
Ele ainda lembra que até o momento, estimativas mostram que aproximadamente R$ 8 milhões circularam na economia do município de 45 mil habitantes. “São melhorias realizadas na estrutura dos prédios, dos apartamentos, compra de eletrodomésticos e tudo isso só pela auto-organização dos trabalhadores Então o que nós estamos pleiteando com a máxima urgência nesse momento é que uma dessas três instâncias do Estado brasileiro, o governo federal, estadual ou municipal, desaproprie a área para que aquelas pessoas possam ter um pouco mais de tranquilidade”, argumenta Pedro Jorge.
O local foi completamente transformado. Do mato, lixo e até mesmo seringas e animais mortos, sem cozinha e com alagamentos, hoje o cenário é completamente diferente. A partir desta autorganização toda a estrutura foi refeita, uma cozinha comunitária no início garantia os alimentos, e aos poucos, com doações, campanhas, organização e muita disposição o panorama é completamente diferente.
“Hoje, quem visita a Ocupação D. Helder Câmara não tem como imaginar como foram os primeiros dias. A área está completamente urbanizada, calçada, iluminada, com calçadas e telhados, estacionamento, murada, tudo feito em regime de mutirão pago com a contribuição mensal dos moradores. No entorno, onde antes havia terrenos desocupados, aparecem novas construções de estabelecimentos comerciais, além de pequenos escritórios de plantão de vendas”, exemplifica.

As crianças também têm um papel fundamental na ocupação. O projeto inicial de estabelecer uma brinquedoteca evolui tanto que foi transformado em um centro de vivência infantil. No local são elaborados projetos com a UEM e outras escolas privadas. Na Torre dois funciona a clínica de psicologia para atendimento especializado. Além disso, um espaço de vivência recebe a escola de circo, além de reuniões de reforço escolas, clubes de leitura e até mesmo um coral formado por crianças da ocupação
Agora a coordenação busca ampliar seus contatos para garantir que o espaço seja, definitivamente, regularizado em prol das famílias. Atualmente a defensoria pública já foi mobilizada e reuniões com representantes das três esferas de governo estão sendo agendadas com este objetivo. Os antigos mutuários já desistiram da compra e na maioria dos casos entraram com ações contra a construtora e o Banco do Brasil, com contratos cancelados há muito tempo, inclusive, antes da ocupação. “A situação é bastante grave. Cabem ainda iniciativas de caráter jurídico para evitar a reintegração. Mas, pode tornar-se dramática se não agirmos imediatamente”, projetou.
O deputado estadual Arilson Chiorato, líder da oposição e presidente do PT do Paraná, destacou a importância do direito à moradia e reforçou seu apoio à regularização dos apartamentos dos “predinhos” de Paiçandu. “Vamos apoiar a mediação destes conflitos fundiários no sentido de que todos os órgãos públicos sejam acionados para conciliação e buscar, ao final, o assentamento das famílias com a garantia do direito à moradia. Vida digna para todos”, garantiu.